É
claro que ela tem seus brinquedos, alguns muito queridos, e que ela
do alto de sua fase egocêntrica vai “proteger” possessivamente
em certas situações, diante de certas crianças: “é meu!”.
Não porque seja egoísta, óbvio, mas porque na sua idade ainda se considera o próprio centro de seu mundo.
Mas
o mais importante pra ela – como pra qualquer criança – é mesmo
o brincar. Ou seja, mais a situação (e a companhia) do que os objetos
em si.
E,
como por ora fizemos essa opção de acompanhar de modo integral sua
criação, talvez seja mais fácil observar de perto o papel destes
brincares no seu cotidiano de ser criança.
Aí vão alguns exemplos caseiros pra refletir e compartilhar:
* Criança
não precisa possuir o brinquedo novo pra se divertir com ele: claro
que criança gosta de novidade, ué! Mas isso não significa que ela
precisa ganhar todo novo brinquedo que desperte seu interesse, não é?
Muita gente confunde isso e quer comprar tudo que parece ter
acabado de interessar a criança. Algumas crianças, dependendo do
histórico de carência afetiva, percebem isso e ficam pedindo tudo
que veem, e aí qualquer ida ao supermercado vira um pesadelo. E
depois, no caso de quem pode comprar, fica aquele monte de bugiganga que a criança nem dá valor.
A
Inaê anda comigo pra cima e pra baixo (até porque não tem como ser
diferente), e a gente entra nos lugares, inclusive loja de brinquedo,
e se for o caso, ela vê, até pega, mata a curiosidade, e
no fim vai embora sem levar, e tudo certo!
Mas
tem umas ideias que eu acho geniais, por ex. brinquedotecas e
bibliotecas públicas, em que dá pra curtir brinquedos,
livrinhos e brincadeiras, frequentemente pedagógicos e/ou
artesanais, e muitas outras crianças também poderão curtir isso. Não é demais?

Na
falta de (muitos) mais espaços coletivos e públicos assim, dá pra
improvisar, e eu já frequentei muita seção infantil de livraria
pra gente se divertir por horas sem precisar consumir.
Outra
ideia bacana são feiras de trocas de brinquedo, como as promovidas em várias cidades do Brasil no último 6 de outubro por
voluntários, a partir de um convite lançado pelo Instituto Alana e
apoiado pelo movimento Infância Livre de Consumismo (e se a gente
estivesse em Brasília teria ido aí ao Jardim Botânico com
certeza!).
* Imaginação
vale mais que brinquedos prontos: essa parece meio
lugar-comum, mas até quem tenta estar atento a isso às vezes se
surpreende com o poder da criatividade infantil. Sabemos que criança não
precisa de boneca que fala sozinha, nem de carrinho que anda por
controle remoto. Por aqui a gente não tem nada disso, mas a Inaê
tem suas bonequinhas, panelinhas etc. e é engraçado demais de vê-la
inventando mil diálogos com suas bonequinhas, inclusive fazendo as
diferentes vozes.
Mas
o que a gente pode perceber nas atuais experiências muito ao ar livre e com
maior liberdade pro brincar é que a viagem infantil vai muito além,
e praticamente tudo vira brinquedo: qualquer graveto vira bonequinho,
sementinha vira comidinha, coquinho vira panelinha, e assim vai. Pra não falar de todos os bichinhos que a fascinam, como formiguinhas, besouros, pássaros, peixinhos.
Fazer
os próprios brinquedos, usando sucata, tinta, cartolina etc., também
é outra forma de exercitar essa imaginação, cada um dentro das
suas possibilidades de trabalho manual, mas as possibilidades são
infinitas. Eu por ex. sou mais da parte
de desenhar e pintar, então vez por outra me aventuro por aqui, e
até casinha já tentei fazer, com a ajuda dela!
* Vivências
cotidianas podem virar brincares: criança vive num mundo
lúdico, em que tudo pode se tornar brincadeira, até situações
típicas do dia-a-dia que a rigor não o seriam. Criança
não trabalha, mas como eu já falei aqui, criança pode ser
envolvida de forma lúdica em tarefas ou situações que os adultos
tenham que fazer naquele determinado momento. Além de ser um
maravilhoso exercício do faz-de-conta, também é uma forma de envolvê-la no que os pais estão
fazendo e aqui volta pra questão da presença dos pais que o movimento Infância Livre de Consumismo tão bem pautou neste texto. Criança brinca sozinha numa boa, mas
muitas vezes ela quer a presença familiar pra brincar. Então, dá pra envolvê-la na feitura de um pão ou um bolo, ou na lavagem de roupa, ou qualquer outra tarefa da casa (como abrir côco ou mexer com a enxada, como os espertíssimos João e Tomás), obviamente adaptando de acordo com o contexto familiar, a faixa etária, e os próprios gostos da criança. A Inaê adora, e frequentemente
depois a gente a vê reproduzindo a situação nas suas brincadeiras
e historinhas.
Ou então, dá pra transformar em grande brincadeira
alguma obrigação do cotidiano, algo que a criança inicialmente não
estaria muito a fim, como por ex. aqui em casa escovar os dentes, mas
aí com grande habilidade (paterna) ela acaba se divertindo e rindo um
monte!
Só que às vezes a gente está com pressa de acabar algo, ou não está com tanta criatividade ou paciência assim (e todo mundo tem seus dias nublados, assim como eu tenho). Porém, o esforço vale a pena. Porque a escolha é nossa: pode-se insistir em acabar o que quer fazer e no fim acabar até gerando uma situação estressante pra todos. Ou pode-se tentar envolver a(s) criança(s), e, se não der certo, parar um pouco e dar a atenção que ela está pedindo, brincando do que ela realmente está a fim de brincar, e logo ela segue brincando sozinha ou de outra coisa, e aí sim você consegue acabar o que ia fazer com todo mundo numa boa – tendo só atrasado um pouco, em vez de interromper tudo de vez!
E
que a gente possa seguir compartilhando brincares com criatividade e envolvimento da família, amanhã e sempre,
porque todo dia é dia de ser criança (até pra quem já cresceu).
(Esta
postagem foi inspirada pela blogagem coletiva proposta pelo movimento
Infância Livre de Consumismo. Você também pode participar e se informar mais aqui.)